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17 de novembro de 2015

Sopro

Fazes-me falta. A tua ausência incomoda. Levaste contigo a vida e o que dela fazia sentido e o vazio que deixaste aqui permaneceu intacto, descolorindo as flores, calando os pássaros, secando o mar, os rios e a chuva. 



No meio da loucura que me venceu, foste a minha última miragem. Consegui ver-te; o meu porto de abrigo, o meu lugar seguro. Corri para ti, para o teu sorriso e para o teu conforto. Enlouqueci ao ponto de perseguir uma miragem de ti.

Mas como todas as ilusões, também tu te desvaneceste no horizonte. Nada restou de ti. E agora já não me consigo lembrar de quem foste. O teu rosto é apenas uma sombra escura arrumada numa gaveta do quarto secreto do meu coração. Pedi-te tanto que ficasses, só por um momento. Mas de nada as palavras me serviram, nem tão pouco as lágrimas que acabaram por secar no meu colo.

No meio do tormento em que se transformou o meu caminho, tentei lembrar-me de ti. Juro que tentei! Tentei recordar os momentos em que a tua mão esteve aqui para amparar a minha, mas os meus dedos nus apenas sentiram o algodão que os tapa. Tentei gritar o teu nome ao expoente, mas dos meus lábios saíram apenas silêncios indistintos. 

Quando ela chegou, limitei-me a recebê-la na minha sala. As paredes cremes estavam despidas das molduras com recordações que se tornaram demasiado dolorosas para reviver. Sentámo-nos lado a lado no sofá castanho, como tu e eu costumávamos fazer. Lembro-me que a lareira estava acesa e que me sentia cansada, mas o calor do fogo já não me aquecia e respirar deixou de ser extenuante. 

Lembro-me de perguntar por ti, ao que ela respondeu, sorrindo.

- Um dia, irão encontrar-se. Mas hoje não.

E assim, foste o meu último sopro. E quando morri, soube-te longe de mim, sem nunca antes te ter sentido tão perto.


2 comentários:

  1. Continua o eterno encanto do amor sempre presente, pena que seja findo e por vezes ausente, mas sem dúvida que é amor e bem expresso

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